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O Brasil no debate alimentos x energia

Por Marcos Sawaya Jank
postado em 17/05/2007

4 comentários
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Na semana passada ocorreu a quinta edição do Fórum Agrícola Mundial, em Saint Louis, Missouri. Participaram do evento 330 representantes de governos, empresas e ONGs de mais de 40 países. Nessa interessante versão agrícola do Fórum Econômico Mundial foram debatidos os grandes temas futuros do agronegócio mundial: recursos naturais, biotecnologia, sustentabilidade, pequena produção, negociações, investimentos, infra-estrutura, etc.

O assunto mais quente da edição deste ano foi a disputa entre alimentos e energia. Diversas mesas-redondas debateram o impacto das commodities agroenergéticas nos mercados de energia (combustíveis, eletricidade) e nos mercados de alimentos, rações e fibras.

Ficou claro que os biocombustíveis irão expandir-se por pressão dos consumidores (interesses em energias renováveis que reduzam as emissões de gases de efeito estufa) e dos governos (segurança energética, subsídios, mandatos de mistura, etc.). A experiência brasileira despertou enorme interesse em todas as mesas que trataram do tema. A nossa matriz energética é composta de 44% de energia renovável ante 14% no mundo e apenas 6% nos países da OCDE.

O Brasil tomou a dianteira na corrida mundial dos biocombustíveis, seja pela nossa vasta disponibilidade de recursos naturais (terra, água, clima), seja pelo amplo domínio tecnológico sobre a cana-de-açúcar, a melhor planta para se produzir açúcar, etanol e eletricidade de forma competitiva.

A novidade recente nessa área é a decisão dos EUA e da União Européia (UE) de mais do que duplicar o seu consumo de biocombustíveis nos próximos seis anos. O problema é que essas regiões contam com lobbies agrícolas poderosos, que defendem um sistema autárquico de produção auto-suficiente, a custos elevados.

A expansão do etanol nos EUA está baseada em milho e, no futuro, celulose (palhadas, forragens, restos de madeira). Na Europa, o modelo baseia-se em colza/canola para biodiesel e cereais (trigo, cevada, milho e centeio) e beterraba no caso do etanol. Qualquer opção usada nesses países tende a ser sempre mais cara do que as alternativas possíveis na região tropical do planeta.

Desde que produzida com alta tecnologia, a agroenergia é uma extraordinária oportunidade para os países subdesenvolvidos da América Latina, África e parte da Ásia. Os debates deixaram claro que os dois grandes desafios da próxima década são a abertura global para os biocombustíveis nos mercados desenvolvidos - que, ao contrário do que ocorre no petróleo, ainda se encontram relativamente fechados - e o tema da sustentabilidade em seus três pilares centrais: econômico, social e ambiental.

A ocupação econômica desordenada pode causar graves problemas ambientais, visíveis tanto na Grande São Paulo como no desmatamento descontrolado da Amazônia. Muitas vezes, há complexos trade-offs neste assunto, a exemplo da polêmica questão da queima da cana-de-açúcar. Queima-se cana para viabilizar a colheita manual. Isso espalha fuligem nas cidades e reduz o balanço favorável de carbono da cana. A colheita 100% mecanizada resolveria boa parte do problema ambiental, mas geraria desemprego, na área social (hoje existem cerca de 250 mil cortadores de cana no Brasil).

Nas mesas de que participei, insisti na tese de que sustentabilidade, aquecimento global e biocombustíveis são temas sistêmicos, que exigem tratamento global. Infelizmente, o tema tem sido debatido no âmbito das empresas e das cadeias produtivas, mas não do planeta como um todo. Inúmeras empresas estão hoje empenhadas em corrigir os seus problemas ambientais e sociais, tentando reduzir o uso de materiais poluentes e a emissão de gás carbônico, melhorar a qualidade do trabalho e economizar energia. O debate avança para a construção de contratos e de mecanismos de coordenação de cadeias produtivas que gerem lucros respeitando o planeta e as pessoas.

Ocorre, porém, que ainda carecemos de um debate global, mais amplo e maduro, já que estes temas jamais serão adequadamente resolvidos apenas no "pequeno varejo" das empresas e dos países, mas dependem de mudanças estruturais no "atacado" do planeta. Por exemplo, há grandes dúvidas sobre se as culturas que vêm recebendo enorme apoio nos EUA e na UE (milho, colza, trigo, etc.) seriam aptas para solucionar desafios energéticos e ambientais. Essas commodities têm importância estratégica nas cadeias de produção de rações, carnes, lácteos e óleos vegetais. No evento, beneficiários dos fartos subsídios saíram com o surrado argumento da "indústria nascente" para justificar o crescente protecionismo. Vindo da boca de grandes empresas do mundo desenvolvido, este antigo conceito só pode soar como refinada ironia!

Entendo que o Brasil deve não só estimular, mas mesmo liderar este fervilhante debate que está ocorrendo no mundo. Precisamos estar presentes em Washington, Bruxelas, Genebra e Tóquio e ter uma ação protagônica nas discussões sobre aquecimento global, seqüestro de carbono, água e florestas, com governos, empresários e ONGs.

É também fundamental trazer maior consistência científica para o debate sobre o crescimento da cana-de-açúcar e seus impactos econômicos, energéticos, ambientais e sociais. A recente visita do presidente Bush colocou o Brasil sob os holofotes nesta área, e um grande conjunto de imagens e prognósticos deturpados vêm sendo divulgados pelo mundo afora.

O Brasil tem uma chance única de surfar à frente dos demais países na onda global da bioenergia, buscando consolidar o álcool e o biodiesel como commodities globais, produzidas de forma ambiental e socialmente correta, numa estratégia sólida que exige ações nas áreas de infra-estrutura, tecnologia, tributação, co-geração, política comercial e investimento. Trata-se de um enorme desafio, que só será possível com intensa coordenação dentro do governo e entre este e o setor privado.

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Marcos Sawaya Jank    São Paulo - São Paulo

Consultoria/extensão rural

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Comentários

Márcia Cabral Dietrich

Rio de Janeiro - Rio de Janeiro - Mídia especializada/imprensa
postado em 20/05/2007

Excelente artigo.Necessário até, porque contribui muito ao trazer para a pauta de discussões, ao ampliar o debate em torno de temas como a bioenergia, sobretudo quanto a possibilidade que o Brasil tem de sair na frente como o grande produtor mundial de biocombustíveis renováveis. Ao que tudo indica, o assunto ainda não despertou a merecida atenção, nem por parte do governo, nem por parte do setor privado, que ainda se limitam a discutir "perfumarias".

Janete Zerwes

Cuiabá - Mato Grosso - Produção de gado de corte
postado em 22/05/2007

Caro Marcos,

Gostaria de utilizar o gancho do parágrafo que encerra seu artigo. Quando diz que devemos aproveitar a onda e surfar a frente de outros países produtores de biocombustíveis. Concordo plenamente nesse aspecto, e também quando diz que precisamos rever as questões das políticas de comércio e ambientais.

Se analisarmos o volume de investimentos que estão sendo feitos no país, na indústria para comercialização e exportação de biocombustíveis, investimentos esses que vem com contratos comerciais firmados antecipadamente, e cujos recursos desconhecemos inclusive a origem - porque esforços tem sido feitos por esses investidores, no sentido de empresas brasileiras assumirem a responsabilidade pelos contratos entre essas indústrias e o setor primário, permanecendo os donos do capital no anonimato.

Gostaríamos de indagar sobre as condições das indústrias legitimamente brasileiras diante dessa concorrência, que dispõe de capital com custos diferenciados, via juros menores; recebe do governo brasileiro incentivo fiscal (enquanto a indústria nacional é tributada severamente) pelos investimentos e pelas exportações; e, têm garantidas antecipadamente, importantes fatias de mercados.

Outra questão que deveríamos considerar se refere aos recursos ambientais transferidos via matérias primas, dos custos desses recursos, que provavelmente serão assumidos pela nação brasileira (especialmente pelo setor agrícola), sem ônus nenhum para esses investidores; muito pelo contrário, a expansão agrícola e as conseqüências das monoculturas (os desmatamentos, impactos da ocupação antrópicas sobre o meio ambiente, contaminações causadas por agrotóxicos), vão ser usadas como argumento, para restringir o consumo de nossos produtos e enfraquecer nossa capacidade de concorrência.

Outra ressalva a ser feita, é sobre o avanço tecnológico que favorece a indústria do petróleo, em termos de aproveitamento das reservas. A economia capitalista e globalizada, sempre irá considerar em primeiro lugar, o preço dos combustíveis fósseis em detrimento dos benefícios ambientais, trazidos pelo uso de fontes de energia renovável, limpa. Hoje a produção de biodiesel está no limiar dessa viabilidade.

É necessário que o governo aprenda a negociar internacionalmente o patrimônio ambiental e os riscos para a produção de matérias primas utilizadas na indústria de biocombustíveis. Busque equilíbrio de condições para os investimentos de capitais externos e capitais brasileiros, especialmente para os investimentos direcionados à produção de biocombustíveis. Que saiba usar como argumento principal, nossas condições climáticas, geográficas e tecnológicas, altamente especializadas para produção de matérias primas destinadas à indústria de biocombustíveis; e traga algumas vantagens à nossa economia e ao desenvolvimento do país.

Abraço,

Janete Zerwes

Lincoln Correia

São Paulo - São Paulo - Consultoria/extensão rural
postado em 28/05/2007

Como sempre todo artigo do Marcos Jank é objetivo e instrutivo.

Atualmente acho que deveremos debater, falar, escrever mais sobre os combustíveis compostos de óleos vegetais (dende, girassol por exemplo), pois não estão na cadeia alimentar humana e/ou animal, como bem citou o Marcos acima em relação ao milho e outros grãos, porque fatalmente o impacto sobre os custos dos alimentos serão grandes. Aliás já se está observando isto no Brasil e nos EUA.

Iremos melhorar o meio ambiente, mas podemos inviabilizar alguns setores por um desequilibrio econômico (avicultura, suinocultura).

Portanto a discussão hoje deve ser na produção de biocombustível (não confundir com biodiesel) e na sua utilização urgente!

Citando o Marcos mais uma vez, não só o Brasil poderá contribuir, bem como os países da África e da América Central.

Juan Manuel Cano Codas

Assunção - Central - Paraguai - Produção de gado de corte
postado em 19/05/2008

Como productor agropecuario del Paraguay estoy contento por esta situación que es algo positivo para que se pueda desarrollar mi país.

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