A agenda agrícola norte-americana que interessa ao Brasil passa por três temas centrais:
As políticas orientadas para os produtores de grãos e oleaginosas, sobretudo as voltadas para a garantia de renda e preço, que tanto distorceram o mercado mundial nos produtos de que o Brasil é também exportador.
A política energética, sobretudo que decisões a nova administração tomará na legislação norte-americana de mistura de etanol na gasolina, e sua predisposição em contar, ou não, com importações, visando a suplementar uma eventual crescente demanda doméstica. Neste tópico, há interfaces também com as questões ambientais, sobretudo no que diz respeito ao papel dos EUA na mitigação das mudanças climáticas.
A política comercial, não somente porque um acordo na Rodada Doha ainda está pendente e continua dependente dos EUA, mas também porque existem negociações bilaterais que poderiam voltar à baila.
A agenda agrícola Brasil-EUA começou a ganhar corpo somente a partir de 2002, quando o Brasil iniciou o contencioso do algodão na Organização Mundial do Comércio (OMC) contra os subsídios norte-americanos. Em razão da estrutura da política daquele país, os subsídios crescem em momento de preços baixos, justamente para compensar a perda de renda do produtor. Foi a partir desse contencioso que Brasil e EUA passaram a se sentar em lados opostos nas negociações da Rodada Doha quando o assunto era subsídio - o Brasil buscando tirar espaço de manobra dos EUA e os EUA procurando garantir que a rodada não levasse a uma reforma nas suas políticas.
Não vejo, nesse tema, nenhuma mudança estrutural com a nova administração norte-americana. A razão básica é que as políticas para a agricultura dos EUA são definidas a cada cinco anos numa Lei Agrícola votada e elaborada pelo Congresso. O Executivo, embora possa influenciar os debates, tem apenas o papel de implementar as políticas. A atual Lei Agrícola dos EUA é recém-saída do forno e vai até 2012. Vale lembrar que o Congresso americano derrubou o veto do presidente George W. Bush à lei vigente. A nova administração pode, quando muito, influenciar as negociações para a próxima lei.
Isso não significa, no entanto, que Barack Obama não terá de trabalhar muito na questão da política agrícola. Ao contrário. Com a redução dos preços mundiais das commodities agrícolas, haverá, certamente, pressões do setor produtivo por mais subsídios. Isso ocorreu no mandato de Bill Clinton, quando os preços começaram a cair a partir de 1998 e o presidente cedeu às pressões do setor agrícola, aumentando os subsídios e indo além dos valores autorizados pela Lei Agrícola de 1996. O exemplo de Clinton é uma prova contundente de que a orientação do presidente não importa muito quando se fala em políticas para o setor agrícola dos EUA. Não acredito que a administração Obama venha a ser uma exceção à regra.
As estratégias de política na área de energia são também um tema de grande importância para o Brasil. Existe consenso no País de que a expansão da produção de etanol depende do mercado internacional. Embora a expansão a que assistimos nos últimos cinco anos tenha sido estimulada, sobretudo, pela expansão da demanda doméstica de etanol com o crescimento da frota de carros flexfuel, o setor sabe que o mercado doméstico tem suas limitações. Hoje, o etanol é responsável por mais de 45% do consumo de combustível dos carros a gasolina. Não há dúvida de que essa participação deverá subir ainda mais à medida que os carros flexíveis se tornarem a maioria da frota. O mercado interno, no entanto, é pequeno perto do potencial produtivo do setor, além do fato de que o crescimento do consumo de etanol se deve dar de forma balanceada com o consumo de gasolina. O mercado norte-americano é, de longe, o mais promissor em termos de consumo e, portanto, de exportações para o Brasil. Os EUA consomem mais de 550 bilhões de litros de gasolina por ano e 10% desse mercado é quase três vezes mais do que a produção brasileira de etanol.
Embora o tom das relações entre Brasil e EUA tenha sempre sido de cordialidade e cooperação na questão dos biocombustíveis, o fundamental para o nosso país seria que o novo governo norte-americano aceitasse a idéia de complementar o mercado doméstico com etanol brasileiro. George W. Bush não viabilizou essa idéia, até porque o mercado dos EUA, do tamanho que foi em seu mandato, ainda podia ser atendido com o etanol de milho americano.
Analisando os discursos de Obama, sou tomado por visões antagônicas. De um lado, o novo presidente defende fortemente a questão da segurança energética. Isso me dá a entender que etanol importado não faz parte de suas prioridades. De outro, Obama defende a idéia de que os EUA devem liderar os esforços para mitigar as mudanças climáticas, o que passa, necessariamente, por tornar a matriz energética dos EUA mais limpa e verde. O etanol brasileiro, sem dúvida, ajudaria nesse processo.
A história das relações Brasil-EUA no tema agrícola indica que somos, acima de tudo, competidores. E assim continuaremos no tema dos subsídios. O etanol, no entanto, pode ser uma exceção à regra. Não será no começo do mandato, mas tem boas chances de ser no final.
Márcio Teixeira
Uruana - Goiás - Produção de leite
postado em 27/11/2008
Prezado André,
Quando vejo esses debates envolvendo os subsídios gigantescos dos países ricos e o governo brasileiro falando somente em etanol, como se a cultura da cana não fosse vinculada a problemas ambientais e sociais, vejo o quanto o país caminha no rumo errado.
Na minha região, em pouco mais de 4 anos, o cultivo da cana chegou e tomou conta de áreas enormes, principalmente porque os proprietários das terras não conseguem ganhar dinheiro e ter renda com as culturas e produtos como o leite, o arroz, milho e o feijão, por exemplo. Ou seja, foi um prato cheio para os usineiros alugarem as terras.
Cabe dizer que essas mesmas áreas foram desmatadas e hoje, além dos produtos químicos utilizados na cultura, do trabalho quase escravo dos cortadores de cana, dos problemas de conservação de solos e do assoreamento e contaminação dos cursos d`água e das queimadas utilizadas na fase de colheita, vão contra a tudo que se fala em preservação do meio ambiente e de respeito aos trabalhadores rurais brasileiros.
Pelo jeito, o governo Brasileiro quer fazer do Brasil um grande canavial e seguir firme no aumento da importação de alimentos como o arroz, milho, feijão, trigo e, quem sabe, voltar a importar leite.
Vai ver quem está errado somos nós produtores rurais que insistimos em produzir alimentos nobres que vão para a mesa das famílias brasileiras todos os dias, e continuamos sofrendo como um cão sem dono e sem rumo.
Att.
Márcio