Neste artigo fazemos uma primeira avaliação dos impactos de uma recessão nas economias avançadas e um menor crescimento dos emergentes no comércio mundial de produtos agroindustriais. Cruzando crescimento da economia mundial com comportamento do comércio de produtos agroindustriais, concluímos que a demanda por importações de produtos agrícolas não passará incólume ao menor crescimento econômico em 2009. Dois efeitos sobre o comércio agrícola são esperados: crescimento menor ou até redução na demanda, e redução nos preços, com maior intensidade naqueles produtos que ainda não tiveram seus preços ajustados já em 2008.
O exercício apresentado neste texto assume que o crescimento das importações de commodities agrícolas está diretamente relacionado com a magnitude da expansão da economia global, que pode ser medida pela expansão do produto interno bruto (PIB) mundial. As perspectivas de 2009 foram avaliadas para os seguintes produtos: soja em grão, farelo e óleo de soja, açúcar, carnes bovina, de frango e suína, milho e algodão. Com exceção de milho e algodão, embora o Brasil seja também exportador, o País está entre os maiores exportadores mundiais dos demais produtos. Ou seja, as perspectivas de evolução de demanda internacional são importantes para entender se a crise mundial vai prejudicar as exportações brasileiras do setor agroindustrial. Lembrando que as exportações do setor representaram ao redor de 35% de tudo o que o Brasil exportou em 2007.
Segundo o relatório do FMI, o mundo poderá crescer 2,2% em 2009. Mas as economias avançadas deverão ter queda de 0,3% em 2009, puxada, sobretudo, por uma recessão de 0,7% nos EUA. Os avançados vinham de 1,4% e 2,6% de crescimento em 2008 e 2007, respectivamente. No caso dos emergentes, o FMI projeta crescimento de 5,1% em 2009, valor menor que os 6,6% esperados para 2008 e os 8,1% observados em 2007. Dos países que são importantes importadores de produtos do agronegócio brasileiro, a China cai de 9,7% em 2008 para 8,5% em 2009, a Rússia, de 6,8% para 3,5% e o Oriente Médio, de 6,1% para 5,3%. Para não passar em branco, o Brasil deverá ter crescimento de 5,2% em 2008 e de 3% em 2009. Vale lembrar que esses números do FMI são considerados otimistas na visão de alguns analistas. É o caso do Banco Mundial, que projeta expansão só de 0,9% para o mundo no seu relatório de dezembro.
Dos setores analisados, soja (grão, farelo e óleo), carne de frango e carne suína são os que apresentaram maior dinamismo, tendo seu comércio crescido a taxas muito semelhantes às do PIB mundial. De 2000 a 2008, o PIB mundial acumulou crescimento, medido em dólares a preços correntes, de 113%. As importações dos produtos mencionados cresceram, em volume transacionado, 78%, 67%, 80%, 91% e 100%. Açúcar, carne bovina, milho e algodão foram os menos dinâmicos, com crescimento acumulado de 26%, 24%, 38% e 44%. As exportações agrícolas totais cresceram mais do que a economia mundial: 152%. O forte aumento dos preços das commodities, observado a partir de 2003, potencializou o crescimento do comércio em valor, dado que os volumes também cresceram significativamente.
O ano de 2008 já nos dá uma prévia do que vai acontecer com os preços no ano que vem. Depois de meses de alta ininterrupta, de julho a novembro os preços mundiais dos produtos da soja já caíram entre 37% e 46%. Milho, açúcar e algodão já assimilaram quedas de 38%, 15% e 29%, no mesmo período. Os preços médios de exportação de carnes do Brasil, medidos até outubro de 2008, estão, por enquanto, mais bem comportados. Na carne bovina eles ainda não começaram a cair, mas na de frango e suína a trajetória de alta já foi interrompida, com reduções, de setembro para outubro, de 3% e 4%. Isso é só o começo do ajuste de preços nas carnes.
Produtos agrícolas são inelásticos a preço, por natureza. Isso significa que a demanda sofre pouco ajuste, para baixo ou para cima, quando os preços sobem e descem. Essa é uma boa notícia quando os preços estão subindo, mas não deixa de ser má quando os preços estão caindo, como assistimos hoje. Relacionando o menor crescimento da economia com a demanda por importações de produtos agrícolas, concluímos que, para 2009, as importações totais de soja e milho deverão cair cerca de 1%. Açúcar e carne bovina crescerão 0,8% e 1%. Óleo e farelo de soja, mais do que compensando a queda na soja em grão, e algodão, crescerão na casa de 1,8%. Frango fica em 1,3% e carne suína bate a casa dos 2% de crescimento. As projeções para 2009 mostram que as importações terão desempenho abaixo da média da década. E mesmo naqueles produtos em que haverá crescimento o ajuste para baixo na demanda por importações não é desprezível.
Um crescimento pequeno no comércio não é novidade nos mercados agroindustriais. Nos últimos oito anos todos os produtos tiveram, pelo menos, um ano de crescimento negativo. O Brasil, sendo um país competitivo no setor agroindustrial, pode até ganhar mercado, deslocando competidores. Menor crescimento nas importações, no entanto, significa que a competição será maior, pressionando os preços para baixo e, por tabela, reduzindo a receita de exportação. O ano de 2009 será, portanto, difícil para a agropecuária brasileira. Espera-se que o governo reconheça essa realidade o mais rapidamente possível.
Helvecio Oliveira
Belo Horizonte - Minas Gerais - Pesquisa/ensino
postado em 23/12/2008
Com quedas de milho e soja, como será a tendência do preço do boi, mediante um possível aumento de consumo de frangos e ovos face à menor disponibilidade de capital devido ao desemprego?