A produção de carne ovina deve atingir 13,9 milhões de toneladas em 2007, um crescimento de 2,1% em relação ao ano passado. Já o comércio mundial de carne ovina deverá crescer 3,5%, permanecendo entre 900 mil e 1 milhão de toneladas.
Outros relatórios da FAO sobre as tendências de consumo de commodities, mostram que o consumo total de carnes deve aumentar a uma taxa de 1,7% ao ano até 2030. A demanda por carne ovina deve acompanhar esse crescimento na mesma velocidade, ficando atrás apenas da carne de frango, que deve apresentar aumento de 2,6% ao ano.
Pesquisas realizadas no mercado nacional também indicam tendências de aumento no consumo de carne. O jornal Gazeta Mercantil publicou recentemente os resultados de um levantamento realizado pela Cogo Consultoria, os quais mostram que os produtos de origem animal foram os alimentos cujo consumo mais aumentou no Brasil na última década. A carne de frango liderou essa tendência, registrando um aumento de 60% neste período e ultrapassando os 35kg por habitante por ano em 2005.
O consumo de determinado alimento em uma região é influenciado por uma série de fatores como hábitos alimentares, preço do produto em relação à renda da população, concorrência com outros produtos, praticidade de consumo, qualidade e propriedades nutricionais do alimento.
Enquete realizada pelo FarmPoint pesquisou entre os usuários do site qual o principal limitante do consumo de alimentos de origem caprina e ovina no país. Foi a enquete que registrou maior participação dos usuários até agora, evidenciando a importância do assunto na realidade atual do setor.
Os dois fatores que mais receberam votos e ficaram praticamente empatados na liderança foram cultura e propaganda (na realidade, a falta dela), que juntos obtiveram quase 60% dos votos.
Tabela 1. Resultado da enquete realizada pelo FarmPoint, nos meses de novembro e dezembro de 2006
De certo modo, as duas opções estão relacionadas entre si de forma bastante coerente. Enquanto a cultura da maioria dos brasileiros não inclui produtos de origem caprina e ovina em seus hábitos alimentares, a propaganda seria justamente uma das ferramentas mais eficientes para reverter esse quadro.
Apesar de não existirem dados oficiais, reunindo-se algumas informações já é possível deduzir que esteja havendo aumento do consumo de carne ovina no Brasil. Ao mesmo tempo em que as importações não param de crescer, os abates inspecionados pelo SIF também aumentam a cada ano. Tendo em vista que o país não exporta carne ovina, todo esse excedente de carne está sendo absorvido pelo mercado interno. Outro fato que confirma essa teoria é o número cada vez maior de pontos de venda comercializando carne ovina.
Além disso, analisando os dados citados no início deste artigo, pode-se acreditar em uma forte demanda potencial aos produtos alimentícios ovinos e caprinos, principalmente de forma substituta às atuais fontes de proteína animal consumidas pelos brasileiros, desde que estes produtos acompanhem a modernização dos hábitos alimentares.
A preocupação com a saúde e com a qualidade do alimento está cada vez mais presente na decisão de compra do consumidor cujo poder aquisitivo permite maior seleção.
A carne e o leite dos ovinos e caprinos apresentam algumas características nutricionais vantajosas em relação aos seus equivalentes bovinos, que podem influenciar positivamente o aumento de seu consumo.
Entretanto, nenhuma característica do produto, por maior que seja seu diferencial, é suficiente para impulsionar esse crescimento e provocar mudanças no hábito alimentar da população. É preciso que o mercado consumidor saiba dessas características e que esteja disposto a pagar por esse diferencial. Para isso, faz-se necessário um trabalho de comunicação com o mercado, no qual fiquem claras as vantagens comparativas que merecem maior valorização. E isso demanda organização da cadeia e, acima de tudo, investimento.
A cadeia do frango passou por uma grande transformação nos últimos trinta anos, que foi acompanhada por uma variação no hábito de consumo de carnes do brasileiro. No início da década de 70, o consumo médio de carne de frango não ultrapassava 2,5 kg/habitante/ano e hoje já está acima dos 35 kg per capita.
O aumento expressivo do consumo de frango pode ter como explicação a redução do preço médio do quilo de R$4,50 para R$1,25 nos últimos vinte anos. Isso aliado ao suporte tecnológico que possibilitou um aumento da produção (217 mil toneladas em 1970, saltando para 4,17 milhões de toneladas em 1996), bem como uma forte política de marketing, que popularizou a carne de frango.
Essas três variáveis permitiram que o frango competisse de igual para igual com a carne bovina, na mesa da família brasileira. Outro fator importante foi a padronização do produto e oferecimento de alternativas visando conveniência e preparo rápido, que reduzem as barreiras de compra.
Da mesma forma, a cadeia produtiva de suínos também batalhou e continua batalhando para desvincular a carne suína de uma imagem pouco saudável e agressora do meio ambiente.
A comunicação com o mercado é importante não somente para elevar o consumo, mas também para combater outros problemas da cadeia, como a informalidade e o desconhecimento da forma de utilização dos alimentos. Além disso, o marketing pode ser utilizado como redirecionador das preferências do consumidor já existente, por meio de indicadores de qualidade e certificação de origem dos produtos.
O consumidor final deve ser o foco de qualquer cadeia produtiva, uma vez que é o elo que injeta dinheiro em todo o sistema. Por isso, um trabalho forte de desenvolvimento de novos mercados, por meio de propaganda e comunicação, traria conseqüências positivas para toda a cadeia. À medida que o mercado conhece um produto e se dispõe a pagar mais por seus diferenciais, todo o sistema de produção é pressionado para atender esse mercado.
Os principais países que comercializam carne ovina no mercado mundial trabalham constantemente para conhecer as preferências do seu consumidor (seja ele doméstico ou internacional), desenvolver um produto que atenda essas exigências e mostrar ao mercado as características diferenciais que valorizam o produto.
Países que contam com uma cadeia mais estruturada, como é o caso de Austrália e Nova Zelândia, destinam uma verba fixa e permanente, proveniente da própria receita gerada pelo produto, para campanhas de marketing e desenvolvimento de novos mercados.
Figura 1. Campanha de marketing da carne de cordeiro neozelandesa, que relaciona a carne com elementos turísticos e ambientais do país e ensina como preparar o corte que aparece no cartão postal (no verso de cada cartão há uma receita)
Figura 2. Campanha de marketing australiana "We love our lamb" (nós amamos nossa carne de cordeiro) para promover o consumo doméstico da carne de cordeiro, neste caso específico, no Dia das Mães
Figura 3. Campanha de marketing de uma marca de leite de cabras no Reino Unido, enfatizando o bem estar animal, a origem local, e as qualidades do produto
A propaganda é fundamental para que um mercado comprador seja desenvolvido e para que isso funcione é preciso trabalhar de maneira coordenada, fazendo as informações circularem entre todos os elos da cadeia, na direção consumidor-produtor, como acontece com o dinheiro que é colocado no sistema.
A criação do mercado é um passo importante na organização de uma cadeia. Diversas estratégias podem ser utilizadas e cada uma delas se encaixa bem em determinada situação. Temos, por exemplo, dois mercados potenciais bem distintos para alimentos provenientes de ovinos e caprinos.
Um deles seria o de maior poder aquisitivo, que pagaria mais por um produto mais elaborado. Neste caso, deveria ser trabalhado o marketing de diferenciação, dando ênfase ao valor agregado desse produto. Como esse mercado pode pagar mais, há espaço para que o custo de produção e processamento seja maior, o que muitas vezes é necessário para agregar valor ao produto.
O outro mercado seria o de menor poder aquisitivo, para o qual o preço é o principal critério na decisão de compra. Para atingir este consumidor, o marketing a ser desenvolvido é o da popularização. A inclusão de alimentos de origem caprina e ovina na merenda escolar é uma alternativa interessante, pois cria o hábito de consumo tanto nas crianças quanto em suas famílias. Neste caso, é importante a redução do custo de produção e processamento visando diminuir o preço do produto final.
Percebe-se, desta forma, que o mercado com o qual se escolhe trabalhar é o que define como deve funcionar cada elo do sistema de produção. Por isso é tão importante o fluxo de informações entre esses elos, principalmente com o consumidor final.
Existem outras inúmeras opções de mercados potenciais no Brasil e fora dele. Para que eles se tornem mercados efetivos, é preciso que se conheça as vantagens de consumir carne e leite ovino e caprino, por meio de um trabalho coordenado de propaganda e comunicação.
Otavio Assad Negrelli
São Carlos - São Paulo - Produção de gado de corte
postado em 21/06/2007
Marina,
Fantástica a forma como conseguiu estruturar num artigo importantes desafios para o posicionamento da carne ovina.
O exemplo do setor de carne suína é bastante ilustrativo. Este setor encontra entraves importantes para a ampliação do consumo, como o paradigma do consumo em "eventos festivos" e um mito de "pouco saudável". Uma das ações que podem servir de exemplo é a aproximação deste setor com a comunidade médica, por exemplo o stand da ABIPECS no GANEP, que é um encontro nacional que reúne nutricionistas de todo o país anualmente.
No momento acredito que o maior desafio seja o do suprimento, que é garantir a presença da carne nos canais de distribuição a custos competitivos. Nesse caso vemos na cadeia de frangos um importante modelo de coordenação vertical. Conveniência, diversificação e outras estratégias de marketing podemos nos espelhar neste setor.
Aredito que nenhum outro tipo de carne tem um potencial tão grande de exploração para a diferenciação como a ovina e a bovina. Sempre que uma organização se formar no setor, deverá ter como norte os principais pontos levantados nos editoriais do FarmPoint.
Abraços