No nosso artigo anterior (Mercado interno e perspectivas para a carne ovina), publicado nesta seção, abordamos um pouco sobre o mercado doméstico da carne ovina, analisando sucintamente o rebanho, a produção, as importações, o consumo e sugerindo, ao final, algumas estratégias competitivas para o setor produtivo. Para tentar complementar esses dados, estaremos analisando neste artigo o mercado externo e adicionando mais algumas informações sobre o agronegócio da carne ovina.
Como mencionado no artigo anterior, houve um processo de redução no rebanho ovino mundial como uma conseqüência da crise que acometeu o mercado da lã e, na Europa, sobretudo no Reino Unido, em decorrência também do surgimento da EEB - Encefalopatia Espongiforme Bovina (mal da vaca louca).
Esse processo iniciou-se ainda no final da década de 1980, porém foi a partir de 1990, quando o efetivo mundial de ovinos se encontrava em torno de 1,2 bilhões de cabeças, que a crise se deflagrou. Resultado de uma série contígua de acontecimentos internacionais no decorrer da década de 1990, a crise do mercado da lã teve como principais causas e agravantes a política de preços e o grande estoque de lã acumulado pela Austrália, o colapso da ex-União Soviética, as crises econômicas que afetaram alguns países na Europa Ocidental e na Ásia, e a concorrência das fibras sintéticas e do algodão, culminando em retração de cerca de 28% na demanda mundial por lã, apenas no período de 1990 a 1999.
Rebanho
Desde então, o movimento de queda tem sido continuo e dentro do período de 1995-2004, houve uma redução de 3,7% no efetivo ovino mundial, como pode ser observado no Gráfico 1. Ao se analisar todo o processo desde 1990, o recuo é de 14,1%. No entanto, observando-se o último segmento do gráfico, pode-se notar uma tendência de recuperação, podendo indicar uma retomada de crescimento ou, na pior das hipóteses, uma fase de estabilização.
Gráfico 1. Evolução do efetivo ovino mundial, em bilhões de cabeças.
O Quadro 1 apresenta a taxa de crescimento de alguns dos principais rebanhos mundiais. Contrariando uma tendência natural seguida pelos mais importantes players no mercado mundial de produtos ovinos, a exemplo da Austrália, Nova Zelândia e Reino Unido, alguns países como a China, a Índia e o Sudão aumentaram seus rebanhos de forma bastante significativa, sendo que serão os países asiáticos e africanos os grandes responsáveis pelo crescimento do efetivo mundial nos próximos anos. Ao se analisar taxas como as da Rússia e Uruguai é que se pode ter a idéia da dimensão do impacto que a crise da lã, ou melhor, que uma crise de mercado pode ter sobre um negócio. Ao mesmo tempo, destaca a importância da gestão estratégica e da diversificação de produtos.
Quadro 1. Taxa de crescimento de alguns dos principais rebanhos mundiais.
Produção
A forte retração na demanda mundial por lã forçou os países produtores a reduzir seus rebanhos via abate e a modificar o perfil da produção, direcionando o sistema mais para a produção de carne. Esta reação do setor produtivo teve forte reflexo sobre a produção mundial, com um aumento de 11,1% no decorrer dos últimos 10 anos, de acordo com o Gráfico 2.
Gráfico 2. Produção mundial de carne ovina, em milhões de toneladas.
Produzindo 24,6% de toda a carne ovina, a China apresenta-se como o maior produtor mundial e possui um fantástico ritmo de crescimento, como é mostrado pelo Gráfico 3 e Quadro 2, respectivamente. No entanto, a produção chinesa é praticamente para atender o mercado doméstico.
A Austrália e a Nova Zelândia são os grandes produtores apesar da redução na produção que ambos vem apresentando desde 1995. Porém, pode-se notar que o recuo da produção é bem menor do que o do rebanho, demonstrando o re-direcionamento da produção e expondo o fato de que grande parte dos animais abatidos são adultos e de origem lanífera, principalmente na Austrália.
Em seguida estão alguns países do Oriente Médio como Irã, Turquia e Síria, outros do Sul da Ásia como a Índia e o Paquistão, e alguns do Norte da África como a Argélia e o Sudão. Todos esses países apresentam, com exceção da Turquia e Argélia, produção e ritmos de crescimento bastante expressivos, destacando a importância da carne ovina na cultura de seus povos - a grande maioria de origem muçulmana.
Os maiores produtores da União Européia (UE) são o Reino Unido, Espanha e França, responsáveis, respectivamente, por 31,8%, 24,3% e 13,1% da produção regional. O Reino Unido ainda é um grande produtor, porém apresenta o maior percentual negativo de crescimento, o que é devido, em parte, aos casos de EEB que tem ocorrido na região desde o ano de 1985.
Gráfico 3. Participação mundial na produção de carne ovina, 2004.
Quadro 2. Ritmo de crescimento dos maiores produtores de carne ovina.
Exportações
Na análise do Gráfico 4, fica claramente evidente que o mercado exportador é dominado pela Nova Zelândia e pela Austrália. Ambos detém quase 70% das exportações mundiais, atendendo mercados em praticamente todo o mundo, uma vez que possuem clientes na América do Norte, na União Européia, no Oriente Médio e no Extremo Oriente. A UE apresenta um volume considerável de exportações, no entanto, seus exportadores geralmente comercializam com países da própria UE, sendo que os maiores vendedores são o Reino Unido e a Irlanda.
Gráfico 4. Participação nas exportações mundiais de carne ovina, 2003.
Importações
Analisando as importações (Gráfico 5), a UE encontra-se em situação de destaque, no entanto, quase a metade do volume importado tem origem em países da própria UE, sendo que a outra metade é fornecida principalmente pela Nova Zelândia. Dentre os maiores importadores europeus estão a França e o Reino Unido, que são responsáveis, respectivamente, por 33% e 28% do total de importações regionais. O restante das importações mundiais está distribuído entre os outros mercados atendidos pela Austrália e Nova Zelândia.
Gráfico 5. Participação nas importações mundiais de carne ovina, 2003.
Consumo
Os países que compõem a União Européia e a Ásia são grandes consumidores de carne ovina, porém ao se analisar o consumo per capita (Quadro 3), mais uma vez, a Nova Zelândia e a Austrália tomam a dianteira. No entanto, elevados consumos são verificados em países do Oriente Médio e Norte da África, a exemplo dos Emirados Árabes, Síria, Irã, Arábia Saudita e Sudão. Os Emirados Árabes e a Arábia Saudita, por sua vez, assumem um importante papel no cenário mundial por serem, também, grandes importadores.
Quadro 3. Alguns dos maiores consumidores de carne ovina, 2003.
Considerações finais e perspectivas
A carne ovina é utilizada e apreciada em todo o mundo, não sofrendo restrições religiosas e/ou culturais, assim como, não tendo sua imagem relacionada negativamente a questões de saúde, como outras carnes.
A demanda mundial por carne ovina é crescente enquanto a oferta tende a permanecer limitada, já que os maiores players no mercado internacional têm apresentado uma continua diminuição dos seus rebanhos e da produção, o que a médio e longo prazo, pode afetar a oferta de carne ovina para atender os mercados importadores, assim como, pode dar abertura para o crescimento de potenciais exportadores, como também, para a entrada de novos concorrentes.
Além disso, alguns dos maiores produtores de carne ovina, como o Irã, Turquia, Síria, Paquistão e Sudão, não exportam nem importam praticamente nada, tendo suas produções quase que completamente direcionadas para os próprios mercados internos. A China, por sua vez, apesar de possuir o maior rebanho e ser a maior produtora, é uma grande importadora de carne ovina, não conseguindo atender a sua própria demanda.
Até o momento, apenas a Índia tem se apresentado como potencial fornecedora de carne ovina para o mercado externo, uma vez que o volume de suas exportações cresceram cerca de 98,3% no período de 1995-2003.
Mesmo parecendo que os países asiáticos e africanos irão assumir posições cada vez mais importantes no mercado mundial da carne ovina, a médio prazo não há perspectivas de mudanças significantes no cenário internacional. A Nova Zelândia e a Austrália ainda permanecerão como os principais comandantes neste negócio. Mas, fiquemos atentos!
João Cláudio Pimenta Penteado Manente
Bragança Paulista - São Paulo - Consultoria/extensão rural
postado em 31/08/2006
Prezado Daniel,
Parabéns pelo artigo, acredito que o mercado de lã também deverá se aquecer em decorrência de um aumento do consumo de produtos naturais, dentro de um conceito de produção sustentável em detrimento do consumo de fribas sintéticas.
Algumas raças de dupla aptidão podem ter espaço neste novo mercado conquistando a preferência de médios e pequenos produtores em regiões próximas a indústrias especializadas.
João Cláudio P.P. Manente
Engenheiro Agrônomo, M.Sc.