Fechar
Receba nossa newsletter

É só se cadastrar! Você recebe em primeira mão os links para todo o conteúdo publicado, além de outras novidades, diretamente em seu e-mail. E é de graça.

Você está em: Cadeia Produtiva > Espaço Aberto

Apagão Logístico - Crônica de uma morte anunciada

Por Marcos Sawaya Jank
postado em 26/03/2013

6 comentários
Aumentar tamanho do texto Diminuir tamanho do texto Imprimir conteúdo da página

 

Volto hoje à carga a respeito do caos na logística de produtos agrícolas que vamos viver este ano. A gravidade da situação está perfeitamente ilustrada na fila de 25 quilômetros de caminhões na Rodovia Cônego Domênico Rangoni, esperando 70 horas para descarregar no Porto de Santos e infernizando também a vida dos que vão para o Guarujá ou para o Litoral Norte.

Não dá para dizer que esse caos seja uma surpresa conjuntural imprevisível. Nos últimos 12 anos a safra brasileira de grãos dobrou de tamanho, enquanto a logística praticamente nada mudou. O que estamos assistindo é à "crônica de uma morte anunciada", após duas décadas de descaso, legislação anacrônica, instalações precárias, burocracia infernal, reserva de mercado e corporativismo endêmico. Enquanto no Brasil o principal modal é o caminhão rodando milhares de quilômetros em estradas esburacadas (55% da distribuição de grãos), nos EUA, nosso maior concorrente, hidrovias construídas há mais de 80 anos nos Rios Mississippi, Missouri e outros respondem por 60% do transporte de grãos.

Hoje nosso maior gargalo está nos portos. A logística portuária começou mal este ano, com 27 dias parados por causa de chuvas - o carregamento dos navios é feito a céu aberto e qualquer indício de chuva interrompe a operação. Além disso, em decorrência da quebra da safra americana, o Brasil tornou-se o maior exportador mundial de milho - com 25 milhões de toneladas exportadas, ante 8,5 milhões na safra passada. Esse imenso volume de milho está atrasando os embarques de soja, que, por sua vez, vão afetar os embarques de açúcar a partir de abril e de milho-safrinha a partir de julho. Na semana passada a fila para carregar soja nos portos brasileiros superou 200 navios, 80 mais do que no mesmo período do ano passado.

De março a julho vamos ter de escoar 7,2 milhões de toneladas por mês de soja e milho pelos portos, valor 25% superior ao do mesmo período do ano passado. Não é difícil prever que esses quatro meses serão um caos, principalmente se chover demais, já que estaremos operando muito próximos da capacidade máxima dos portos. Outra agravante é a nova lei dos caminhoneiros - que determina paradas obrigatórias dos caminhões a cada quatro horas, com jornada máxima diária de 11 horas -, além da falta de caminhoneiros, estimada em 50 mil a 100 mil profissionais. Isso sem contar a deficiência de armazéns, uma vez que só conseguimos estocar 65% dos grãos produzidos no País. Ao contrário do que ocorre nos nossos principais competidores, no Brasil o caminhão tornou-se um "armazém sobre rodas", porque não tem onde colocar o produto e no auge da safra a única solução é a carreta na fila de espera para o porto.

A conclusão é que no curto prazo a única variável de ajuste possível serão novos aumentos de fretes, destruindo a rentabilidade dos produtores e dos traders. Dez anos atrás, o custo de frete no Brasil era duas vezes superior ao da Argentina e dos EUA. Este ano, numa visão otimista, será, no mínimo, quatro vezes superior (mais de US$ 100/t, ante cerca de US$ 25/t nos nossos concorrentes), chegando a ser cinco a sete vezes maior para as regiões mais distantes do Cerrado.

Não é de espantar, portanto, que um grande importador chinês tenha cancelado o carregamento de 33 navios de soja, trocando o suprimento brasileiro pelo da Argentina. Os chineses são extremamente oportunistas nessa hora e, obviamente, utilizam esse recurso para renegociar os seus contratos em melhores termos. Mas a culpa não é deles, é nossa!

A única solução para o caos logístico encontra-se no médio e longo prazos e se chama investimento maciço. Precisaríamos investir pelo menos R$ 40 bilhões no sistema portuário, montante quase três vezes maior que a soma prevista nos programas PAC-1 e PAC-2. Um dos caminhos mais importantes para isso seria a aprovação da Medida Provisória 595, a "Lei dos Portos", ora em tramitação no Congresso Nacional. No entanto, diversos itens do projeto ainda mostram fortes controvérsias entre os vários grupos de interesse envolvidos.

São eles: 1) A distinção entre os terminais dentro da área do "porto organizado" e os terminais de uso privado fora dela, incluindo a redefinição dos limites geográficos de cada porto, chamados de “poligonal”, um tema extremamente polêmico; 2) a redefinição das licitações para concessões ou arrendamentos, agora com base no critério de modicidade tarifária (maior movimentação com a menor tarifa); 3) o tratamento a ser dado aos terminais de uso privativo hoje existentes dentro de portos organizados, principalmente o dilema do encerramento versus prorrogação dos atuais contratos de arrendamento; 4) o fim da distinção entre movimentação de "carga própria" e "carga de terceiros" como elemento essencial para a exploração das instalações portuárias autorizadas; 5) a nova organização institucional dos portos e a redefinição do poder concedente nas concessões; 6) o compartilhamento de infraestruturas; e 7) o tratamento diferenciado para trabalhadores portuários.

O fato é que, no campo, fizemos muito bem a nossa lição de casa. A produtividade total dos fatores (terra, trabalho e capital) da agricultura brasileira é a que mais vem crescendo no mundo: 3,6% ao ano desde 2000. Mas a logística está destruindo tudo o que foi conquistado dentro das fazendas, não apenas no exemplo dos grãos, mas também do açúcar, das carnes e de outras commodities, hoje igualmente "engargaladas".

Infelizmente, temos de nos conformar com o fato de que o "apagão" da logística chegou. Neste momento, além de rezar para que ele não seja total, deveríamos concentrar-nos na aprovação urgente dos marcos regulatórios e dos investimentos necessários para escapar dessa calamidade. E isso ainda vai demorar alguns anos. 

Saiba mais sobre o autor desse conteúdo

Marcos Sawaya Jank    São Paulo - São Paulo

Consultoria/extensão rural

Avalie esse conteúdo: (e seja o primeiro a avaliar!)

Comentários

Fernando Antonio de Azevedo Reis

Itajubá - Minas Gerais - Produção de leite
postado em 27/03/2013

Sou apenas um produtor de leite, mas me parece estranho um produto agrícola principalmente do centro-oeste ter que cruzar de caminhão a região mais industrializada e povoada do pais que é São Paulo, onde temos congestionamentos  enormes e ainda transpor a serra do mar até o porto de Santos!!!

Gostaria de saber da soja exportada qual a porcentagem escoada em cada porto.

Qual a opção de transporte, se os nossos rios correm sentido opostos a serra do mar e cheios de usinas?Ferroviário?

E esse item 7 - Tratamento diferenciado aos trabalhadores portuários, morei em Santos na minha juventude e me lembro de falarem que os portuários eram complicados?

Sempre vejo que o produtor cumpre o seu papel, quem está falhando?

Alex M. M. Sá Andrade

Juiz de Fora - Minas Gerais - Rep.comercial
postado em 27/03/2013

É amigo, o nosso grande problema se chama Congresso Nacional , onde os interesses próprios são prioridade....e quem perde com isso é  o Brasil.

Carmen

Caçapava - São Paulo - Consultoria/extensão rural
postado em 27/03/2013

É com imenso pesar que se lê o artigo. Cada linha verdadeira! Tudo isto vem sendo dito a anos!!!
Novamente o Brasil vai perder oportunidades por TOTAL IRRESPONSABILIDADE.
De quem? dos nossos governantes!
A classe produtora faz o seu papel, e bem bem feito!

Paula Cristina Marcondes Lários

Itiquira - Mato Grosso - Consultoria/extensão rural
postado em 27/03/2013

Marcos mais um artigo surpreendente.
Somente pergunto onde está nossa bancada ruralista?
Onde nosso novo Ministro da Agricultura ENGENHEIRO CIVIL está nos ajudando
Nosso governo só quer saber de Copa do Mundo
Dane-se 33 navios cancelados da China, dane-se o preço da soja estar mais baixo e com tendência a cair mais
Dane-se dane-se dane-se
Que venha a copa do mundo e ninguem comerá nada, comeremos bola de futebol que só isso importa.
Nossos anismais não precisam de ração a base de milho e soja, precisamos somente de futebol!!!!
Isso aí Brasil...Isso aí PT...Parabens!!!!!

Hermenegildo de Assis Villaça

Juiz de Fora - Minas Gerais - Pesquisa/ensino
postado em 27/03/2013

Muito bom e realista este artigo. 
Espero ver estas sugestões na prática, sem corrupção e implementadas
com EFICIÊNCIA, coisa que muito nos falta.
Continue com suas sugestões Dr. Marcos, pois precisamos de cabeças pensantes.
Agua mole em pedra dura, tanto bate até que fura.
Precisamos furar!< O bom entendedor que sabe a que me refiro>

Joel Naegele

Cantagalo - Rio de Janeiro - Produção de leite
postado em 01/04/2013

Como diz o articulista Marcos Jank, já faz tempo, muito tempo mesmo, que esse assunto está na pauta de debates, incluindo Seminários, Congressos e outras atividades  de caráter político-institucional, que penetrou fundo nos mesmos fazendo ampla abordagem a respeito. Há dois ou três anos a Sociedade Nacional de Agricultura fez realizar no Rio de Janeiro um Congresso reunindo as grandes inteligências do setor, só para tratar dos problemas ligados a Logística, olhando, exatamente para a grande produção brasileira de grãos e a curta visão estratégica de um governo apenas voltado para concessão de"bolsas" de favorecimento com vistas às eleições. Esse o PT que nunca teve projeto de governo e, sim, projeto de poder, coisa que fica cada vez mais claro na visão dos que pensam o país. A medida provisória há pouco remetida ao Congresso é um passo importante que está arriscado a ser totalmente "emporcalhado"  por interesses escusos de deputados e senadores comprometidos apenas, com seus próprios interesses. Pobre país, pobres produtores eficientes brasileiros.

Quer receber os próximos comentários desse artigo em seu e-mail?

Receber os próximos comentários em meu e-mail

Envie seu comentário:

3000 caracteres restantes


Enviar comentário
Todos os comentários são moderados pela equipe FarmPoint, e as opiniões aqui expressas são de responsabilidade exclusiva dos leitores. Contamos com sua colaboração. Obrigado.

Copyright © 2000 - 2024 AgriPoint - Serviços de Informação para o Agronegócio. - Todos os direitos reservados

O conteúdo deste site não pode ser copiado, reproduzido ou transmitido sem o consentimento expresso da AgriPoint.

Consulte nossa Política de privacidade