Particularmente, a Biologia Molecular é tanto uma área de pesquisa básica quanto um conjunto de ferramentas moleculares à disposição de outras áreas das ciências biológicas, médicas e agrárias. Como ferramenta, ela é conhecida também por outros termos sinônimos e se confunde com estes. Quem ainda não ouviu falar da Engenharia Genética ou da Tecnologia do DNA recombinante? Mais recentemente, ao final da década passada, a Genômica veio como desdobramento direto da Biologia Molecular, ganhando proporções gigantescas como ciência que promete resolver várias questões científicas.
Quase tudo o que a Biologia Molecular básica descobre acaba se revertendo em ferramenta de trabalho para outras disciplinas. Por exemplo, a elucidação da estrutura da dupla hélice por Watson e Crick, em 1953, e a conseqüente descoberta dos mecanismos de replicação da molécula de DNA levou, anos depois, em 1986, à grande sacada científica que gerou a técnica de PCR (do inglês Polymerase Chain Reaction, ou Reação em Cadeia da Polimerase). A PCR é sem dúvida a ferramenta de Biologia Molecular mais utilizada nos dias de hoje, se não diretamente, como base para outras técnicas, como o sequenciamento, um dos principais recursos da Genômica Estrutural e Funcional.
Já que a Biologia Molecular se aplica a qualquer área das ciências biológicas, médicas e agrárias, em relação à Sanidade não seria diferente.
A Sanidade, aqui definida como a ciência que estuda as doenças infecciosas e parasitárias, metabólicas e nutricionais, e também as de origem genética, tem como objetivo promover a saúde e o bem estar. Ela também se enriquece com esses recursos.
Certamente a principal aplicação da Biologia Molecular na Sanidade é o Diagnóstico Molecular. A PCR é a ferramenta que permite a detecção dos ácidos nucléicos de patógenos mesmo quando há poucas moléculas destes na amostra (baixa cópia), ou seja, é uma ferramenta que possui uma alta sensibilidade. Além disso, detecta mutações que estão associadas a doenças genéticas e metabólicas. O diagnóstico rápido e acurado, por sua vez, é essencial para definir os procedimentos terapêuticos e, em alguns casos de detecção mais precoces, retardar ou impedir a evolução da doença.
Em alguns casos, além da detecção, é necessário fazer a tipagem do agente causador da enfermidade, ou seja identificar pequenas variações gênicas inter ou intra-específicas e classificar as variantes de acordo com estas variações. Várias ferramentas, baseadas na PCR ou na digestão por endonucleases (enzimas de origem bacteriana que cortam o DNA dupla-fita em seqüências específicas), ou ainda em uma combinação das duas, permitem a chamada genotipagem do DNA.
Em doenças de origem genética, a genotipagem se faz útil para determinar o alelo, ou a variante genética, responsável pela manifestação da doença, permitindo também o estudo destas doenças ao longo de famílias ou linhagens. Em doenças infectocontagiosas, a genotipagem auxilia na definição das estratégias de controle da enfermidade. Estudos filogenéticos e seus desdobramentos práticos, como a rastreabilidade de processos e de produtos de origem animal ou vegetal, são também ferramentas úteis na elaboração e implantação de boas práticas de agropecuárias.
Além da aplicação da PCR no diagnóstico molecular, os estudos de expressão gênica ou de determinação de carga de um determinado agente infeccioso podem ser executados por uma variante da técnica: a PCR em tempo real, mais sensível que a original. Os estudos de carga de agente permitem identificar se um agente bacteriano, viral ou parasitário está se replicando no organismo e assim auxiliar no estudo dos mecanismos da patogenia.
Os estudos de expressão gênica são importantes, pois a simples presença de um gene deletério não implica necessariamente na manifestação da doença. Para que a doença se manifeste é necessário determinar se o gene é expresso ou não. A expressão ocorre quando o RNA mensageiro e a proteína codificados pelo gene são transcritos e traduzidos, respectivamente. Tanto a falta quanto o excesso de expressão podem determinar a doença, depende do gene em questão.
Ferramentas modernas, como os microRNAs, têm sido uma grande promessa como ferramentas na terapêutica, já que permitem, pelo menos experimentalmente, controlar o nível de expressão de genes, uma vez que se ligam às moléculas de RNA mensageiro, quebrando-as e impedindo gradual ou totalmente a tradução do respectivo gene pelo ribossoma. Enquanto este fato não se torna uma realidade nas prateleiras de farmácias e casas agrícolas, a Biologia Molecular continua contribuindo com a indústria farmacêutica na produção de proteínas e vacinas de DNA recombinantes, procedimentos, hoje tão corriqueiros, que podem ser considerados clássicos.
A Biologia Molecular está em constante avanço e sempre atingindo novas fronteiras do conhecimento. A incorporação de suas ferramentas nas pesquisas das áreas biológicas, médicas e agrárias igualmente reflete o quão estas áreas de conhecimento estão atualizadas.
As ciências agrárias já vêm incorporando a Biologia Molecular nos seus laboratórios de pesquisa básica e aplicada, mas ainda há muito a ser feito, principalmente quando comparado aos avanços da área médica. Ainda é preciso acabar com o mito de que a Biologia Molecular é uma disciplina composta por cientistas malucos: ela é acessível a todos e suas ferramentas são precisas e de múltiplas aplicações.
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