O ano de 2006 foi bastante adverso para os produtores de soja. No âmbito externo, houve novamente uma grande volatilidade nas cotações da Bolsa de Chicago, com o preço médio fechando ligeiramente abaixo da média histórica e de 2005 (Figura 1). No primeiro semestre os preços oscilaram entre US$ 5.50 e US$ 6.00/bushel. Os picos de preços ocorreram inicialmente com especulações a respeito do clima na América do Sul e depois com o clima nos Estados Unidos. No segundo semestre os preços começaram a recuar.
Em setembro foi registrado o menor patamar do ano, com o início da colheita de uma nova safra recorde nos EUA. Em seguida houve uma recuperação das cotações até chegar aos maiores preços em novembro, com a combinação de perdas de produção mundial no trigo e no milho.
Figura 1 - Evolução dos preços internacionais de soja (US$c/bushel)
No front interno, o ano foi muito ruim na ótica da comercialização dos produtores brasileiros. A combinação de valorização da taxa de câmbio com elevados custos de produção, culminou em queda das margens de rentabilidade dos produtores de soja. Além disso, os produtores amargaram perdas de produtividade em função do clima adverso e do avanço da ferrugem asiática. Em algumas localidades de Minas Gerais, Goiás e Mato Grosso houve a necessidade de realizar até 4 aplicações de fungicida, a um custo médio de 3 sacas/ha para cada aplicação (Figura 2).
Tudo isso acabou onerando os produtores, que já se encontravam em uma situação financeira ruim, sobretudo no Mato Grosso. De concreto, pode-se dizer que a safra brasileira inicialmente prevista em 57 milhões de toneladas, recuou para cerca de 53 milhões de toneladas. As exportações do complexo (soja, farelo e óleo) recuaram 165 milhões em relação a 2005, fechando o ano de 2006 em US$9,3 bilhões (Figura 3).
Figura 2. Incidência de ferrugem asiática na soja: evolução da aplicação de fungicida no Brasil.
Fonte: Agroconsult
Figura 3. Exportações brasileiras do complexo soja (US$ bilhões).
Para 2007, o sentimento de curto prazo é de uma safra sul-americana recorde, garantindo boa disponibilidade para o ano comercial 2006/2007. Os estoques de soja em grão, segundo o relatório de oferta e demanda do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA), publicado em de fevereiro de 2007, foi projetado em 57,4 milhões de tonelada para 2006/2007 ante 52,2 milhões de toneladas na safra anterior.
Para o Brasil, a Conab divulgou também em fevereiro deste ano o seu quinto levantamento para a safra de grãos. A estimativa é de queda de 7,4% na área plantada de soja e incremento de 5,4% na produção, devido a uma condição climática e sanitária melhor que a da última safra (Tabela 1). O estoque final foi estimado em 2,28 milhões de toneladas, respondendo por cerca de 7,5% do consumo ante 4% no ano passado. Apesar da melhoria essa relação encontra-se aquém da média histórica.
Tabela 1. Produção e área plantada de soja no Brasil: safra 2005/2006 e 2006/2007.
Fonte: Conab (fev/2007)
No âmbito sanitário, o controle realizado pelo Sistema de Alerta implantado pela Embrapa Soja indica o registro de 1.353 casos de ferrugem asiática em 13 estados. Paraná, Mato Grosso do Sul e Bahia foram os de maior ocorrência, com 616, 394 e 128 casos, respectivamente (Figura 4).
O quadro mais úmido desta temporada tem favorecido a propagação da doença. Todavia, o controle pelos produtores até o momento tem sido eficiente. Em Minas Gerais, as chuvas mais intensas em algumas regiões, principalmente no Triângulo Mineiro, tem sido o principal inconveniente. Mesmo assim não se fala ainda em grandes perdas de rendimento.
Figura 4. Número de ocorrências de focos de ferrugem asiática (safra 2006/2007*).
Por outro lado, existe a influência do escasseamento dos estoques mundiais de trigo e milho, e o sentimento crescente de que os produtores norte-americanos tendem a preferir plantar esses cereais no cultivo da nova safra, resultando em recuo na área de soja em 2007/2008 e possibilidade de estoques menores. No farelo, a relação estoque/consumo mundial deve permanecer baixa (Figura 5). Ainda assim, o abastecimento deverá ter seu suporte na boa safra de soja em grão. O mercado mundial de carnes deverá seguir em expansão e a expectativa do FMI para o crescimento da economia mundial em 2007 é de 4,9%, portanto um cenário mundial muito bom. Assim, espera-se expansão das taxas de consumo para o complexo soja e oleaginosas.
Figura 5. Farelo de soja: relação estoque/consumo no mundo (%).
No que tange ao impacto sobre os preços internacionais da soja, que reflete diretamente nos custos da pecuária leiteira, a expectativa é de cotações acima da média de 2006, devido principalmente à tendência preliminar já mencionada de redução na área de soja nos EUA para a temporada 2007/2008, perdendo espaço basicamente para o milho. Complicações de clima tenderiam a ter forte impacto sobre o mercado. O preço médio internacional da soja grão registrou aumento de 14,5% em janeiro de 2007 em relação a janeiro de 2006. Nesse mesmo período o farelo subiu 7,8%.
No mercado interno, o aumento de preços deve seguir Chicago, sem grandes oscilações oriundas da taxa de câmbio. A média das projeções de taxa de câmbio, agrupadas pelo Banco Central, indica cerca de R$2,18/dólar em dezembro de 2007 (Relatório de Mercado, 09/02/2007). Portanto, semelhante ao valor médio de 2006. Os preços da soja em grão neste inicio de ano vem se mantendo superior ao do ano passado. Em janeiro de 2007, por exemplo, a saca de 60 kg em Uberlândia foi cotada em R$ 33 ante R$ 29 em janeiro do ano passado.
Desse modo, a tendência para o ano que segue é de margens se recuperando para os produtores de soja brasileiros, com lucratividade bruta melhor que a de 2006. Embora ainda continuando com situação financeira delicada. Já para os produtores de leite, espera-se um custo médio do concentrado acima do ano passado, não apenas pela elevação do preço da soja, mas sobretudo do milho. No final de março, o USDA divulgará a intenção de plantio nos EUA para a próxima safra, fator que será relevante no âmbito da orientação dos mercados de grãos e farelos.
Guilherme Leite Lopes
Valença - Rio de Janeiro - Trader
postado em 28/02/2007
Li uma matéria no "Wall Styreet Journal", há duas semanas, fazendo uma análise semelhante à sua, sobre as comodites milho e soja. Lá, o analista deixou claro que estas mercadorias deverão ter seus preços aumentados em 50% nos próximos 3 anos e alerta aos produtores de leite, de carne suina e frango que dias difíceis terão que enfrentar no curto, médio e longo prazos , respectivamente.
Resposta do autor:
Caro senhor Guilherme, agradeço pelo envio de sua carta. Seu comentário é bastante oportuno e ajuda a levantar a preocupação sobre o incremento do preço do concentrado. Estamos vendo é uma mudança na agricultura mundial decorrente principalmente do aumento do consumo de etanol (e possivelmente no futuro também de biodiesel). Com isso, estima-se que os preços mais altos do milho farão com que a área ocupada com milho nos EUA cresça nos próximos anos.
Como há uma escassez de terra disponível lá, esperara-se incrementos de preços para as três grandes produções do meio oeste: trigo, milho e soja. Parte destes aumentos já ocorreram e realmente poderá haver uma pressão nos custos de produção de leite, frango e suíno. O reflexo sobre as margens de rentabilidade dos produtores de proteína animal vai depender da evolução dos preços de seus produtos.
O leite, por exemplo, está subindo no mercado internacional. A dimensão desse aumento é difícil dizer e irá depender das condições futuras de oferta e demanda.
Obrigado,
Glauco Carvalho