Hoje em dia, com a divulgação, com a estruturação das Associações de Criadores, com a implantação de tantas empresas de assessoria e de informação, os que iniciarem esta atividade terão ao alcance todas as ferramentas para fazer um planejamento e determinar as necessidades básicas, sem desgaste.
O início da minha criação foi muito especial. Gosto de lembrar dos momentos divertidos, dos sustos, das vendas, dos amigos clientes e dos clientes amigos. A aquisição das primeiras cabras foi pitoresco e especial, e acho divertido compartilhar com todos o que aconteceu.
Em 1992, eu e minha família mudamos para a casa que nasci, que recebi de herança. Tem um terreno grande, com um bosque. Apesar dos meus esforços, o mato tomava conta de todo o terreno. Eu já estava ficando cansada de lutar com o mato. Conversando com minha mãe, "chorei pitangas" e disse que não sabia mais o que fazer, que eu precisava de uma roçadeira bem grande para dar conta de todo aquele mato. Minha mãe disse que ia dar um jeito e que iria mandar a "roçadeira" para mim. Fiquei mais contente.
Alguns dias depois chegou um caminhão em minha casa e o motorista disse que estava trazendo uma encomenda, enviada pela Dona Farid. Fui toda contente receber a "máquina" que acabaria com o meu sofrimento!
Tal não foi minha surpresa quando o homem retirou do caminhão 1 cabra e 2 cabritinhos amarrados com uma corda bem suja. Não adiantou perguntar, o motorista dizia que foi minha mãe que mandou.
Liguei imediatamente para minha mãe, que disse:
- Você não queria uma roçadeira? Esta vai dar conta de todo o mato, você não precisa fazer força e ainda dá um leitinho!
Começou então o meu "caso" com a caprinocultura. Eu não sabia nada de criação de cabras. Nem sabia o que elas comiam!
O motorista do caminhão disse que eu não precisava "de incomodação, as cabras se viram sozinhas". Era só eu amarrar a mãe no meio do mato que ela "buscava o sustento". Achei muito estranho. Como um animal iria sozinho achar o que comer? Eu achei que deveria cortar e picotar o mato para ela comer. Que engano! No mesmo dia a cabra "roçou" um pequeno pedaço do terreno, comendo até o chão aquele mato que tanto me incomodava.
Os cabritinhos então, acompanhavam a mãe e mamavam o dia inteiro. Um vizinho veio ver as cabras e disse para eu dar "uma quarta" de milho por dia, para aumentar o leite. Bom, primeiro eu tive que descobrir o que era uma quarta, 250g, depois achei que jogando o milho no chão, como se faz com as galinhas, ela gostaria muito.
Engano novamente. Descobri que esta e todas as outras que tive, não gostam de milho pisado, jogado no chão. Tanto a ração, milho ou feno tem que ficar no cocho, longe do chão, pois não comem o que foi pisado ou babado pelas outras.
Como eu gostei da companhia da família caprina, achei que deveria conhecer mais a respeito da criação como alimentação, doenças, parto, etc. Achei o telefone da Associação dos caprinocultores do Paraná-CAPRIPAR, e fui participar de uma reunião, na mesma semana.
Como eu trabalhava na Caixa Econômica Federal e estava tão interessada na criação, que saí da reunião como tesoureira da associação, pois entrei bem na época de votação da nova diretoria. Fiquei alguns anos neste cargo e em outros, aprendi muito com os associados que tornaram-se amigos. E, naquela semana aprendi que deveria cuidar para que os cabritinhos, 2 machos, não cobrissem a mãe, pois eles são muito precoces. Achei isso demais para a natureza e não acreditei. Mal sabia que já havia acontecido.
Na sexta feira seguinte chamei um veterinário para examinar a mãe e os filhotes. Ele fez um exame superficial e disse que estava tudo bem. Perguntei o por quê daquelas bolas grandes de um dos lados da barriga dela. Ele disse que era o estômago cheio. Achei então que era normal.
No domingo cedo, amarrei a cabra que já tinha nome muito criativo "Bita", e seus filhos para pastarem. Entrei em casa e minha filha veio gritando, dizendo que cabra estava passando mal. Quando cheguei perto dela tive a surpresa mais agradável da minha atividade: presenciei o nascimento de cabritinhos.
Fiquei boba ali, olhando a bolsa escorregar e lá dentro o cabritinho com o olho aberto dar uma espécie de pulo, estourar a bolsa e ficar deitado no chão, até a mãe virar-se e começar a limpá-lo, lambendo avidamente todo o seu corpinho. Neste momento, toda a família estava em polvorosa: o marido foi buscar (colocar para carregar) a filmadora para registrar o acontecimento e um pedaço de carpete, pois disse que ela não poderia ter os filhos na terra; a filha mais velha veio com um guarda-sol, dizendo que estava muito sol para ela parir os filhos ali, e eu pedi para a outra filha buscar uns panos para eu ajudar a limpar o bebê (um detalhe, ela pegou os panos de prato mais bonitos da cozinha, com bordados e crochê).
Nasceram então mais dois cabritinhos e eu ficamos ali, de joelhos, vendo a maravilha da natureza agindo, só para o meu deleite. Fiquei tão maravilhada que nem falava. As crianças perguntavam, gritavam, riam e a nossa Bita, muito tranqüila, lambia os filhotes.
Quando os bebês já estavam sequinhos, começaram a ficar em pé e a procurar as tetas daquele úbere rosado e cheio. Eu não sabia o que fazer, mas por instinto ajudei-os na primeira mamada. Algum tempo depois, embrulhei os filhotes nos belos panos de prato e os levei para a casa deles, tendo o cuidado de separar os dois irmãos mais velhos.
Aquele foi um dia especial. A partir daí, a minha paixão pelas cabras apareceu.
A Bita, uma cabra mestiça Anglo com pelagem tartaruga, e seus 5 filhos foram o início de uma criação muito especial. Comprei outras cabras, tomei emprestado alguns bodes para a cobertura, adquiri um bode Saanen premiado, depois troquei por um Tog, vendi, troquei, e no final eu estava com 46 cabras e filhotes, 23 em lactação.
Estudei, pesquisei, aprendi na prática, em cursos, troquei experiência com meus amigos caprinocultores e fui muito feliz. Agora as recordações tem um sabor adocicado de saudade. Um dia retomarei esta atividade e volto a criar as minhas amigas.
Rodrigo Carlos Wansovicz
Mafra - Santa Catarina - Produção de caprinos de corte
postado em 16/10/2007
Neyd cheguei ao final de seu artigo com lagrimas nos olhos, sua história lembra bastante a minha. Assim como você, nunca fui criador de animais e o mais próximo que tinha chego de um cabrito até então, havia sido na churrasqueira. E também assim como você sou apaixonado por este animal chamado cabra, a quem costumo chamar de minhas meninas.
Realmente a emoção de um parto é algo impar. Acompanhar o crescimento, ver os bebês virarem cabras e terem seus filhos e todo ciclo ter reinício, conhecer cada cabra por seu nome e ao chamá-las ouvi um bééé e um balançar de orelhas, não tem preço. Espero que logo possa voltar a ter sua criação, realmente o trabalho é árduo mais recompensador.
Parabéns pelo artigo, empolgante como sempre. É sempre muito bom ser seu leitor, e como sempre, ansioso pelo próximo.
Rodrigo
Resposta da autora:
Rodrigo,
Agradeço o comentário. Somente quem passou por estes momentos comoventes sabe o quanto são importantes. Cada vez que conto esta historia fico muito emocionada, lembrando com alegria os tempos em que trabalhava e convivia com esses animais divertidos e brilhantes.
A relação com as cabras fica sendo íntima a ponto de descobrirmos que a nossa amiga não está bem só de olhar! Quantas vezes ao olhar uma cabra com o queixo mais baix que os ombros e já ficou preocupado, pois tinha a certeza que algo não estava bem? É a nossa intimidade e o amor por elas. A forma como nos olham, o berro, a vibração ou a falta dela quando fazemos um carinho já nos informa da sua saúde. E o que fazemos? Corremos atrás dos remedinhos ou chamamos o veterinário.
Casar com um caprinocultor é como casar com um médico: com certeza vai ter que dividir o tempo dele com os pacientes e com os livros. Mas, esta vida de caprinocultor é muito boa, senão não teríamos tantos amigos na área!
Abraços.
Neyd Maria Makiolka Montingelli
Curitiba/Pr