Não bastassem as derrapagens na retomada americana e as constantes incertezas europeias, coroadas pelo recente debacle grego, colaboraram para acentuar o nervosismo dominante as turbulências sociopolíticas em países do Oriente Médio e do norte da África, no primeiro bimestre, e o terremoto no Japão, no início de março.
As commodities não passaram incólumes pelos vagalhões, tanto em razão dos movimentos financeiros que os sucederam quanto pelas ameaças ao consumo que representaram. Mudanças de posições dos fundos de investimentos desnortearam os mercados em alguns momentos, e a volatilidade dos preços deu o tom, incentivando uma união de esforços para coibi-la cujo capítulo mais recente e decepcionante foi escrito na semana passada, na reunião dos ministros da Agricultura do G-20, em Paris.
Mas, apesar dos percalços, os fundamentos de oferta e demanda prevaleceram. O apetite dos emergentes continua a desafiar inclusive as espirais inflacionárias, e, em muitos casos, as produções crescem menos e os estoques continuam magros. Resultado: com a preciosa ajuda oferecida por um dólar fraco, o primeiro semestre foi positivo para as cotações da maior parte das commodities agrícolas negociadas pelo Brasil no exterior.
Cálculos do Valor Data baseados nos contratos futuros de segunda posição de entrega (normalmente a de maior liquidez) de produtos referenciados nas bolsas de Chicago e Nova York mostram que seis deles (açúcar, algodão, cacau, café, soja e milho) alcançaram suas maiores médias semestrais históricas entre janeiro e junho em termos nominais. As médias do trigo e do suco de laranja foram as terceiras mais elevadas.
Para analistas e consultores, nos últimos meses, a resistência dos preços comprova que as matérias-primas para a produção de alimentos ganharam um novo status neste início de milênio, em larga medida em função da aceleração do consumo em países emergentes como China, Índia e Brasil.
E como a oferta deverá aumentar menos do que a demanda no curto e médio prazos, as perspectivas de órgãos como FAO, OCDE, FMI e Banco Mundial apontam para uma nova década de commodities em alta, ainda que com os solavancos de praxe.
Solavancos como os que derrubaram as cotações dos grãos na quinta-feira em Chicago, a partir da divulgação de um relatório do Departamento da Agricultura dos Estados Unidos (USDA) que apontou estoques maiores que os esperados naquele que é o maior produtor agrícola do mundo.
Mesmo com as fortes desvalorizações que se seguiram ao relatório, importantes para os preços médios menores em junho do que em maio, soja, milho e trigo fecharam o mês passado com consideráveis valorizações sobre as médias de junho de 2010. A maior dessas altas é a do milho (97,39%), seguida pela do trigo (57,15%) e a da soja (45,16%).
Mas vale ressaltar que a perda de sustentação teve lá suas consequências. Levantamento divulgado na segunda-feira pelo Instituto Mato-grossense de Economia Agropecuária (Imea), ligado à Federação da Agricultura e Pecuária do Estado (Famato), mostra que por lá os produtores de soja estão segurando as vendas do que resta da produção (10%), à espera de melhores preços. No milho, onde mais de 30% da safra ainda tem de ser comercializada, a estratégia é semelhante.
Nessa frente, básica para a produção global de alimentos e rações e pesada no custo de vida, os efeitos do clima sobre as safras do Hemisfério Norte continuarão ditando as influências "fundamentais" em julho, e as reações "altistas" a quaisquer ameaças à oferta tendem a continuar estridentes. E não será surpresa se os grandes fundos renovarem suas apostas nas agrícolas de Chicago, já que no terceiro bimestre muitas fichas deixaram esse tabuleiro.
Em Nova York, onde são transacionadas as chamadas "soft commodities", o cenário não é muito diferente. Em meio às correntezas financeiras, o algodão sofrerá as mesmas influências americanas dos grãos, o clima e as safras no Brasil devem seguir ditando o ritmo dos mercados de açúcar e café, a temporada de furacões nos Estados Unidos ainda puxará o suco de laranja e a Costa do Marfim mandará no cacau.
Entre as "soft", mostram as contas do Valor Data, apenas o cacau encerrou junho com cotação média inferior à do mesmo mês do ano passado (0,97%). Entre as demais, a maior alta na comparação é a do algodão (72,14%), seguida pelas de café (71,28%), açúcar (60,53%) e suco (28,58%).
A reportagem é de Fernando Lopes, para o jornal Valor Econômico, adaptada pela Equipe CaféPoint.
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