Não sei a resposta à primeira pergunta. Mas posso dizer que ela é baseada na crença de que o agronegócio gerou a miséria que ainda existe no meio rural brasileiro. Nessa linha, é o agronegócio que impede o desenvolvimento dos povos tradicionais, indígenas e minorias étnicas que vivem dos recursos naturais, pois é um modelo baseado em escala - confundida por essas lideranças como monocultura - que concentra terra e, pelo uso de sementes transgênicas e agrotóxicos, promove a destruição da biodiversidade, de que tanto dependem tais povos. Além disso, segue o raciocínio, o agronegócio não possibilita a emergência e o acesso a tecnologias adaptadas para esses povos e aos agricultores familiares. Paro por aqui antes que eu seja convidado a fazer parte do Consea. E me concentro na resposta à segunda pergunta.
Não se trata de negar que ainda persistam no País situações de insegurança alimentar e que as comunidades onde a insegurança mais predomina são as dos povos tradicionais e indígenas. O problema existe e precisa ser combatido, com ações governamentais e o reconhecimento da sociedade de que a História do Brasil carrega um passivo que precisa ser atacado. Aliás, vale lembrar que muitas outras nações encontram o mesmo tipo de desafio e o estão enfrentando, em muitos casos, de formas diversas das escolhidas por aqui.
É preciso lembrar ainda que, como qualquer economia que ainda tem instituições em formação, problemas de corrupção e definições frágeis de questões-chave, como direitos de propriedade e ameaças à biodiversidade, existem: nas propriedades rurais, nos assentamentos da reforma agrária e nas reservas indígenas. É sabido que o desmatamento e a degradação florestal ocorrem nos três, sem privilégio de culpabilidade para nenhum deles.
Também posso reconhecer sem maiores dificuldades que boa parte da pesquisa agrícola, e tenho muitas e boas razões para afirmar que essa foi uma opção correta, está orientada para desenvolver tecnologias que tornam os sistemas produtivos - via sementes melhoradas, práticas de produção que usam melhor a terra, técnicas de manejo que procuram maximizar o uso dos insumos, etc. - mais eficientes e com maior produtividade. Tais pesquisas procuram dar soluções tecnológicas a sistemas produtivos que estão integrados aos mercados, uma vez que estes são caracterizados pela competição e pela tendência estrutural de queda real dos preços dos alimentos. Assim, sistemas de produção de base agroecológica, defendidos como opção correta pela conferência citada, que atendem predominantemente mercados locais e ainda não se mostraram capazes de produzir com eficiência e escala as commodities comercializadas nos mercados globais, tendem a receber menos atenção dos pesquisadores e das empresas de pesquisa.
Por fim, podemos facilmente verificar que o modelo agrícola brasileiro usa bons contingentes de terra, como o fazem as reservas indígenas e o faria a produção agroecológica se todo o alimento consumido no Brasil viesse desse tipo de agricultura. Usar terra, assim como comprometer a biodiversidade, não é e nunca será exclusividade do agronegócio.
Todas as questões apresentadas têm, ao menos em teoria, soluções. Nenhuma delas, no entanto, emerge do reconhecimento, explicitamente colocado em todos os documentos de suporte à conferência, do papel de vilão do modelo agroexportador brasileiro. Mais do que isso, todas as soluções podem ser idealizadas e implementadas independentemente da existência do agronegócio. Ou seja, embora seja a escolha feita pelas lideranças da segurança alimentar - a de que só o modelo da agroecologia pode garantir segurança e qualidade alimentar no Brasil e, portanto, o agronegócio não beneficia as camadas da sociedade que enfrentam a insegurança alimentar -, a emergência de um não ocorre em detrimento do outro. Somente na cabeça dos formuladores das políticas de segurança alimentar no Brasil é que todos os problemas serão resolvidos se o agronegócio for extirpado.
Trata-se de uma visão ideológica, que confunde o modelo agrícola contemporâneo - aquele que se desenvolveu a partir dos anos 1970 e hoje conhecemos como agronegócio - com a exploração do patrimônio rural do passado histórico brasileiro e tem enorme dificuldade de reconhecer no Estado o grande responsável pelos problemas de insegurança alimentar que perduram no Brasil. São os setores do agronegócio integrados aos mercados globais que estão incorporando, nos seus sistemas produtivos, ações de sustentabilidade e de responsabilidade social. Ignorar esse fato e igualar o agronegócio ao proprietário de terra do passado brasileiro significa apagar a História recente do Brasil em busca de um modelo de meio rural em decadência.
A matéria é do Ícone, para O Estado de São Paulo, adaptada pela Equipe Agripoint.
Walter Jark Flho
Santo Antônio da Platina - Paraná - Consultoria/extensão rural
postado em 06/12/2011
Recentemente, li no "estadão" artigo do Xico Graziano sobre a questão da segurança alimentar. O que mais me chamou atenção foi um dado da FAO segundo o qual são necessários 2,7 ha de terra agricultável,no mundo, para alimentar uma pessoa. Num primeiro momento achei que havia algum erro de digitação. Entretanto ,pelo texto ,o número parece estar correto. Como sou agrônomo comecei a fazer cálculos e não tenho a menor dúvida ,que para as condições de Brasil , é muita terra para alimentar uma só pessoa. Entretanto o número foi apresentado com a informação de que logo logo não haverá terra agricultável suficiente para alimentar a população crescente no mundo. O que tem a ver isso com o texto acima ? O agronegócio é fundamental para saciar a fome no mundo. E quem acha que agronegócio é sinônimo de monocultura ou extensas propriedades , está redondamente enganado. No Paraná mais de 70% dos produtores de soja são os chamados "Agricultores Familiares". O mesmo vale para outros produtos como leite, suinocultura ,avicultura, milho fruticultura olericultura ...
Está certo que o número de grandes produtores está aumentando mas vale lembrar que no Brasil 80% dos produtores são caracterizados como agricultores familiares.
E qual a diferença entre os grandes empresários e os agricultores familiares? Apenas a escala de produção. As duas categorias tem o mesmo objetivo. Produzir para vender.
Vender para ganhar dinheiro. E produzir produtos agricolas para se vender ,hoje se chama de agronegócio. Portanto é uma discussão ridícula de ambientalistas que não conhecem nada , absolutamente nada de agricultura.
Um fato é concreto. O número de pequenos produtores está diminuindo. Isto não significa entretanto que a agricultura familiar é incompativel com o chamado agronegócio, que por sua vez é essencial para a segurança alimentar não só do Brasil
como tambem do mundo.
Walter